terça-feira, 30 de março de 2010

Felicidade instantânea

Andava com muita pressa e calor quando ouvi tocar, bem longe, uma guitarra. Agitava minha bolsa. Podia parar no tempo para explodir novamente como ali, e saborear aquela voz tantas vezes até me embebedar com aquele som, não o som nu, mas a lógica na ordem do som. Meus olhos lacrimejaram alegres, saltou de mim uma luz que deve ter cegado algumas pessoas, elas olhavam curiosas, espantadas, e tal. Refleti um brilho sol de meio- dia e saltei em busca de mim mesma, para encontrar-me ali, depois da esquina, com o futuro. Eu vi.
.Vi realidade virar sonho

domingo, 28 de março de 2010

Eu e ela

"- Estou precisando tirar férias de mim mesma.


Mudez absoluta.


-Eu não. Estou precisando tirar férias comigo mesma."

terça-feira, 23 de março de 2010

Fui-me Embora pra Pasárgada

Fui-me embora pra Pasárgada,
que fiquei perdida por aquelas ruas,
que pinguei gota a gota como remédio,
que não caibo mais no vazio daquele mundo velho,
nem ele, insano e torto,
preenche minhas vísceras por completo.

[sou pensamento novo a cada novo segundo]

Bem sei, tentei de tudo.
Conheci Teerã à Madagáscar.
Escorri na rosa dos ventos e
ventei o grito nos cantos.
Quero a loucura da rainha!
Intensidade do não conhecer.
Prefiro ter asas, ver por cima,
o plano baixo me bloqueia os olhos.
Prefiro ver em outra parte, de lá,
acompanhada pelo rei
na cama que escolherei.
Construirei a civilização aventureira
no rio, na bicicleta, nas histórias .
Arrumei minhas malas.
Recheei sonhos mofados com coragem lavada,
observei e estudei os mapas.
Não me espere para o café,
talvez não haja retorno.
Venha logo Manuel.
Estarei acontecendo!
Fui-me embora pra Pasárgada.





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alusão a "Vou-me Embora pra Pasárgada", Manuel Bandeira.
Um dia, todo mundo quer ir pra lá.

terça-feira, 16 de março de 2010

Balança


Após pôr um pé na realidade, a gente põe o outro.
E espera, em companhia da senhorita paciência, devolverem o tempo de sonho em que se vivia.
Fica, tomando esperança em copo de cerveja na esquina até devolverem de volta a alegria.
A demora se cansa.
Alegria parda brota do chão naturalmente em aprendizado, sem semente ou água, nasce erva qualquer. [Mas não é qualquer].

Menino, escute seu Zé, ele sabe o que diz:
"Se estás no balanço, balança. Sonho é realidade bem vivida.".

Filipe

Seria contrariar a verdade se dissesse me lembrar minuciosamente do primeiro encontro que nossa mãe programou para nós, meio assim, cheia de entusiasmo e medo. Eu vagamente enxergo vultos como imagens delicadas de uma criança, pequena e gorda, na minha frente.
Venha ver o que ele comprou para você!Fui logo apressada, curiosa e interessada no embrulho presente sobre a cama. Sim, era belíssimo, encantador. Poderia dormir e acordar com tantas peças, móveis minúsculos e bonecos ao meu lado. Montava e destruía as casas fantasiosas que surgiam em meu mundo infantil. Completa criatividade, eu moraria junto com o brinquedo, se coubesse na caixa. Bem sei, reconheço o quanto me apaixonei por aquele presente. Como ele poderia saber perfeitamente o que gosto? Era apenas um menino novo, novíssimo, não falava, não andava, não corria, não saía, só chorava, só chorava e cagava. Mais tarde, quando os anos vieram roubar um pouco do meu encanto e ilusão, percebi que a escolha não tinha sido feita por ele. Mas, o que é isso? Ele tem uma pinta no braço? Sim, e o médico falou que nem precisaria marcação ou identificação. Este era originalmente original de fábrica. Mãe ria, sorria. Eu a acompanhei em seu gesto, ri e sorri encarando o menino da pinta. Faltou tocar sinos, porque ao examiná-lo, contando cada linha e atravessando seu corpinho com meu dedos de cinco anos, entendi o verdadeiro sentido de amizade. Então, finalmente notei o grande presente que tinha ganhado. Aquele bebê, aquele bebê seria meu presente para a vida toda, um tesouro, sem mapas, histórias, um tesouro não escondido, um tesouro na vitrine, exposto, em órbita, nu, espalhado, solto, livre. Constituído não de ouro e diamantes, mas de você, meu moreno, um tesouro todo meu de Filipe.


[Te amo]

sábado, 13 de março de 2010

Querida flor,

Não adianta, minha nega, todo mundo já percebeu. Inclusive lá em casa estão comentando. Está transparente e decifrável. Está no ritmo dos quadris, no brilho dos seus cabelos, na cor morena demais da sua pele. Não adianta. Está no ar que expira modificado, tão filtrado, um novo perfume. Nessa coisa toda um quê ímpar, completamente seu, privado. Voltou no tempo, voltou? Pois parece que voltou à idade flor da vida. Como se recolhesse os frutos e revolucionasse os sabores. Você não me engana mais. Descobri a fundo seu segredo em uma traição própria: ele revelou-se. Entendo, flor, não há hora ou data marcada para ser feliz, mas peço humildemente que dissolva esse tanto de poesia no chão ao passar. O céu claro demais, o sol quente demais tem sede de ti. E eu cá, estou cansado. Diferente do que vejo, esses móveis são obviamente mais velhos que eu, mas andam com postura ereta melhor que eu. Não ria. Apesar do riso ser a expressão habitante na face dessa ousadia juvenil. Declaro a incógnita exposta. Você não me engana. Já descobri porque está assim tão leve, jovial, solta, o andar quase bailando pela principal. Pare. Causa ciúmes no velho. Agora vá! Vá vestir um pedaço de pano que cubra essa felicidade toda!

quarta-feira, 10 de março de 2010

Crítica suave

Não há necessidade em nos auto declarar constituídos de metais pesados. Somos frágeis demais para tais comparações. Nem sempre podemos nos caracterizar rígidos, duros ou firmes. O vigor raramente nos ensina. Na maioria das vezes é concreto aprendermos quando há flexibilidade no conteúdo, possibilitando enxergar de maneira neutra ou positiva não somente o que convém, mas também o que repugna. Ando pensando e minhas reflexões levam-me, comummente, à perguntas anos-luz mais complicadas e temíveis que as originais ao pensamento. Alguns passos para trás revelam visões distintas do futuro, atitudes, quem sabe, inovadoras. Mas cheguei a uma conclusão - posso estar errada ou não, e desculpe-me se tiver tomando seu tempo com discussões supérfluas e se nossas opiniões tomarem caminhos opostos - que líquidos com certos metais rapidamente morrem, se assim podemos metaforizar, enferrujam. Logo, descobri que quero estar fundida e ser preenchida de matéria gelatinosa, a qual eu possa moldar quando bem entender ou ela própria moldar-se naturalmente quando necessário, no tempo e no espaço. Quero ser disso, sei lá o quê, para poder adaptar-me a condições oferecidas pela minha vida. E eu mesma, modificar minha forma, nunca faltando a substância, mas modificar minha forma a fim de encontrar o pote que me sustenta. Há um equilíbrio, não perfeição. Óbvio que raros são aqueles que já encontraram este estado. Eu mesma ainda não. Mas sendo assim, e sabendo que assim devo ser, fica mais fácil descobrir a real constituição. Digo não a isso ou aquilo. Digo sim, estou na piscina em colóide pronta para reagir meus elementos.

[?]

sábado, 6 de março de 2010

Hei

Quando crescer quero fazer poesia na borda de vestido rendado.

Escrever rima no muro
ver minhas palavras colorindo o papel
alegrar pequenas cabeças
gritar nas bocas
entrar nos becos.

Como doce em tarde de criança
como sofá em casa de vovó
como futebol em domingo de pai
como feto em útero de mãe.

Quero ver colorir colorido
à guache, à óleo, à crepom
fazer poesia em pele de moça
E crescer como a poesia.

A poesia de mim que hei de crescer completamente louca!






Parênteses

( na madrugada, despertei ainda anestesiada do sono profundo ouvindo barulho de mar. Levantei da cama meio tonta, e cambaleando fui em direção à janela. A porta do quarto fechada proporcionava um ambiente escuro no qual a visão permitida era essencialmente mínima aos olhos. Mas o quarto era meu, por isso saberia mover-me de cabeça para baixo com venda preta, ou há milhas daqui em pensamento. Abri a janela para passar míseros momentos apreciando a paisagem. O barulho era tentador. Lentamente as peças de madeira se afastaram e o vão ficou formado bem ao centro, uma greta. Cocei os olhos para ver com objetividade, eu permanecia sonolenta. Vi foi uma parede amarela e um muro amarelo. À frente, o micro ecossistema - também conhecido como o jardim, área verde da minha casa - a grade, a rua, a casa da frente, a casa do lado da casa da frente, as pintura mal feitas, uma laje, um telhado, o poste marrom, a trepadeira subindo por ele, enfim. Vi tudo normal. Alucinação minha foi supor que abriria a janela e veria um belíssimo oceano azul com ondas quebrando na praia, barquinhos a navegar e umas gaivotas sobrevoando a região em forma de vê. Só depois fui descobrir que o barulho era apenas o meu ventilador. Era verão.)

quinta-feira, 4 de março de 2010

a ponta de sonho daquele dia

Vivi ou viverei
o caminho que finda num pedaço de céu,
onde folhas secas caem mesmo no verão,
onde o calor e o frio agitam ar em balé,
e vento preguiçoso acaricia o mato crescido na beira da
estrada.
Vejo olhares desconfiados a bordar o chão em passos.
Estes passos seguem uns aos outros,
sem pressa de ir. De chegar.
Sinto gosto do chocolate quente na caneca florida
aquecendo lábios e coração.
Abraço todo espaço no abraço
vazio sereno completo.
Fotografia ficou branca de sonho
que fechei forte os olhos para só sentir
desejo.
Foi a paz boa de ter,
foi amor virar solução,
foi nossas mãos parecerem ter dado nó.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Que adianta pintar a fachada de SorrisoS ,
se, por dentro, a casa está mofada?

segunda-feira, 1 de março de 2010

Era uma vez uma lagarta verde que se camuflava nas folhas verdes de um campo de girassóis. Morava, desde pequena, naquele belo lugar, povoado de ninguém, só de flores amarelas como o sol girando e girando e jamais se cansando de girar como o sol.
Deu primavera, lá em Setembro mesmo, aposto, e a lagarta sentiu um sentimento novo, sei lá, amor e ódio. Queimou o corpinho verde. Ela chorou a dor que doía. Foi-se embora morar numa casa feia. E lá ficou por muito dias, lá ela refletiu sobre sua vida e escolhas, metaformoseou outro ser. Sabedoria, equilíbrio, tudo veio ao vento, soube lidar com problemas e crescer forte. Saiu borboleta.
Ao abrir os olhinhos viu muitas telas de mesma cor. O amarelo do campo ressaltava seu azul do céu. Os girassóis nem mais se importavam com o sol. A conversa fiada de quem é essa borboleta céu nova que chegou de onde veio nunca vi ela é bonita sei não era preocupação geral. Quase fizeram revolução, história para boi dormir, mentirinhas, quem conta um conto aumenta um ponto, coisas de vizinhança.
O tempo, deus dos deuses, foi passando, passando. Quando um dia, quem passou por ali foi um homem. Alto, esbelto, jovem, cheio de vida, reflexo de saúde e blá blá blá, encantou a borboleta , que se apaixonou.
Liberdade no amor não há. Há um corpo só quando os dois corpos se juntam. Foi então, entre suspiros e voos, que ela e todo seu azul colaram-se na pele do homem, rasgou o desejo, sangrou azul. Virou tatuagem em um corpo só. Porque liberdade no amor não há.