Pensamentos dispensáveis, curvilíneos e roucos, desses que a vazar pela madrugada distorcem a calma e invadem qualquer quarto apagado supostamente cheio de sono, põem-se a desafiar o sossego da alma. Escutava este raciocínio desacreditado, até experimentar o abismo interminável de silêncio, motivo de guerra extraordinária entre sanidade e loucura, concorrentes famintos por nosso tempo. A maior inquietude nasce da quietude humana e provoca avalanches na mente. Vovó já dizia “cabeça vazia, oficina do diabo”. Sempre escutei os mais velhos, apesar de sua fala não trazer em anexo um manual com instruções ou uma comprovação científica ou um tradutor para a modernidade, mas só pude realmente compreender o dizer ao tornar-me dependente da solidão e permitir que idéias tortas e descoloridas acompanhassem-me por dias. Não que eu queira entrar no plano das crenças, longe disso, este momento é impróprio para discutir o poder real dos deuses, se é um ou mais, vivo ou morto, não sei. Para isso, não ter argumento é meu único argumento. Só digo o que sinto, nem mesmo o que penso. O que penso só penso, sem longas explicações. Apenas o que sinto consigo destrinchar. E sinto, quando calo-me apático, e sinto, quando reprimo a voz, e sinto, quando assassino os sons. E sinto, diabo é pensar demais. Sem filtro. A solidão mente vestir-se de tristeza e significar silêncio. São três pontos diferentes capazes de se cruzar. Só que às vezes, por estar triste e sozinho e calado, a gente acaba escutando de si o indevido. A partir de então, começa a inventar histórias improváveis, conversar com pessoas inexistentes, preferir ficar em casa a ir ao cinema, preferir ficar em casa a ir trabalhar, fingir surdez ao trim trim do telefone, esquecer que há mundo lá fora. A partir de então, a gente fecha as portas e as janelas, abre os olhos somente em lágrimas até afogar-se e inventa que a vida, mesmo tendo, não tem mais solução.
Quando pensamos demais, acabamos por encontrar caminhos que não deveriam existir. E possíveis perigos, antes incapazes e frágeis, podem agora nos impedir.
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